Na tarde cinza e chuvosa, me encontro por algumas horas só. As criancas estao ocupadas em brincar, Jörg apesar das férias está entusiasmo por terminar a sua última obra – sua oficina. Estava pensando em como vivemos uma semana triste. O ataque de terror em Oslo, a morte de Emy Winehouse, a fome e a seca em vários países da costa leste da África. É revoltante a sensacao de impotência que sinto frente a tantos acontecimentos trágicos que nos circundam. Por isto resolvi publicar algo bem diferente. Resolvi que compartilharia a possibilidade de viajarmos para a Índia ao lermos as experiências de viagem de uma pessoa muito querida – Apparecida Zaroni – e que me proporcionou o prazer e a licenca de publicar aqui as suas impressoes mais pessoais sobre este país quando o visitou. A descricao de sua viagem é fantástica e me ajudou muito a quebrar outros tabus.
“Vivendo a Índia em minha viagem
Dizer para alguém que você vai fazer uma viagem à Índia desperta reações adversas: há os que aprovam e aplaudem; há os que estranham e se escandalizam com sua decisão.
Uma coisa é certa: ninguém fica indiferente à sua comunicação.
Só por isto já se vê que a Índia desperta no imaginário das pessoas uma repulsa ou atração, muitas das vezes sem nenhum fundamento. Todos, sem exceção sabem de algo, ouviram contar uma história, formaram uma impressão a priori e como aquele país/continente é mágico e cheio de mistérios, a expectativa se instala.
Foi cheia de expectativa que, em início de janeiro, com um grupo de amigos liderado por um indiano, rumei via África do Sul para um passeio à Índia.
No primeiro dia, não nego, assustei-me. O trânsito caótico, a multidão na passarela da mesquita de Haji Ali que me deixou meio perdida, o cheiro forte exalado do mar naquele lugar estranho, o grande número de mendigos, muitos mutilados na passarela e o gosto do alimento, tão diferente de nosso costumeiro arroz com feijão, provocaram em mim o famoso choque cultural.
A cada dia sempre aparecia algo de inédito: suntuosos templos, cavernas misteriosas, fortes enormes, mesquitas, manada de búfalos em meio ao trânsito, mercados movimentados, vacas solitárias pelas ruas, camelos puxando carroças, caminhões coloridos e enfeitados, festas animadas de casamento, vendedores ambulantes com mercadorias de preço accessível.
À medida que os dias foram se passando, quase sem aperceber-me, fui me apaixonando pela Índia, por seu povo com seu olhar penetrante, sua hospitalidade, sua cultura, sua arquitetura, seus templos e monumentos milenares.
Tomar o masala chai (chá com mistura de especiarias e ervas aromáticas) após as refeições, comer biryani e pulau ( tipos de arroz com misturas) saborear o puri, o chapatis ou o naan (espécies de pão) ou o pastel somoza foi se tornando rotineiro e agora, à distância, chego a sentir saudade daquele gosto.
A viagem no avião da South África, com escala em Joannesburgo (África do Sul) tanto na ida como na volta foi a maior dificuldade que enfrentamos não só pela distância como pelo desconforto de suas instalações, na classe econômica.
Dos meios de transporte que usamos, destaco a liteira , carregada que fui por quatro homens na entrada da ilha, quando do acesso à caverna de Elefhanta (Mumbai); o riquixá que usamos quando chegamos ao Taj Mahal (Agra); o auto riquixá – o popular ‘tuc- tuc” que várias vezes nos transportou pela cidade de Bubhaneswar e o elefante todo enfeitado e pintado que nos levou até o Forte Amber, na cidade de Jaipur.
As emoções mais fortes foram desencadeadas quando:
– da visita à casa de Ghandi;
– do atravessar o Portal da Índia;
– do sentir um pouco os ensinamentos budistas nas cavernas Kanheri, em MUMBAI;
– do extasiar com a beleza do hall de entrada do Hotel Ramada Plaza, onde nos hospedamos em Delhi;
– do convite à interiorização, no templo Lótus e quando do percorrer embevecidos as alas do templo Akshardham, também em DELHI;
– da visita ao monumento símbolo do culto ao AMOR – o indescritível Taj Mahal, em AGRA;
– de elefante, chegamos ao Forte Amber;
– apreciamos o Palácio Hawa Mahal- o palácio das janelas, em JAIPUR;
– das minhas andanças, sozinha, pelas ruas de BUBHANESWAR;
– vimos crematório público em plenas funções na cidade de PURI;
– fizemos a massagem ayurvédica que ativou nossa circulação, ao mesmo tempo que relaxou nossos tensos músculos após tantas andanças no micro ônibus que seguramente nos transportava pelas ruas e estradas indianas.
Na Índia, sons, cheiros, cores, sabores, movimento de vida, velocidade do tempo têm uma originalidade e uma característica especial. Se tudo é difícil de entender pela originalidade e pelo ineditismo, mais difícil torna-se explicar.
A Índia dos contrastes nos leva a indagações sem respostas claras, mas não deixa de ser um enigma difícil de entender:
Por que tanta gente pobre em meio a um PIB crescente?
Por que tanta desurbanização frente a uma tecnologia avançada?
Por que tantos desabrigados ante a suntuosidade de prédios recentemente construídos?
A India dos contrastes nos deixa uma imagem misto de sonho e realidade como a:
- da jovem de sari rosa pink bordado de pedrarias brilhantes alimentando vacas num curral lamacento de barro preto que vimos da janela do ônibus;
- do festival de pipa, em Jaipur, colorindo o céu (os soltadores calmamente estavam posicionados sobre as lajes do casario) e nas ruas, o trânsito caótico;
- de homens mijando pelo chão dos caminhos, enquanto no ar pairava um misticismo e um mistério enigmáticos.
A Índia dos contrastes provoca-nos muitas exclamações, muitos questionamentos, porém mais de que tudo isto, um mundo de reflexões.
A experiência de visitar terras do oriente foi para mim, como ocorre em todas as viagens, intransferível e despertou o desejo de voltar outra vez ao país misterioso.
Vamos?”
Apparecida Zaroni (fevereiro 2011)
Beijos.